sábado, 17 de dezembro de 2011

DIREITO DO CONSUMIDOR CHEGOU A UM PONTO DE MATURIDADE



Com mais de 20 anos da entrada em vigor do Código de Defesa do Consumidor, marco legal que inaugurou essa nova faceta do Direito no Brasil, qualquer retrospectiva que se faça está sempre presa a ele. É uma característica marcante do Direito do Consumidor.
E 2011 não poderia ser diferente. O principal fato que marcou o ano, em especial o meio acadêmico e científico, foi a proposta de alteração do Código de Defesa do Consumidor feita por uma comissão nomeada pelo presidente do Congresso, encabeçada pelo ministro do STJ Antonio Hermann Benjamin. Ali estão pessoas de reconhecido valor jurídico, como Ada Pellegrini Grinover, Kazuo Watanabe.
A ideia de alterar o Código dividiu as opiniões desde a sua edição. Há a corrente que defende a não alteração do Código. A manutenção do código tal como está, pelo temor de que as alterações podem prejudicar os interesses dos consumidores, e que conta com árduos e ilustres defensores é, por princípio, reacionária. E não reconhece que a legislação possa evoluir, corrigindo erros e aperfeiçoando acertos. Ao longo dos anos, não se tem notado a efetivação desse temor.
A proposta apresentada para debate neste ano basicamente cuida da questão do superendividamento (com a estranha sugestão de proibição de propaganda que anuncie “juros zero”), da ação civil pública e do comércio eletrônico. Dois dos temas são “novos”, já que não temos legislação específica no Brasil. São questões relevantes. Já a ação civil pública deverá, segundo o projeto, sofrer importante evolução, visando, também, a redução da avalanche de ações de consumo que tem assoberbado o trabalho dos magistrados em todo o Brasil, especialmente nos Juizados Especiais Cíveis. Há muito a corrigir na proposta, mas são assuntos importantes e que merecem nossa atenção.
Como de hábito, se inseriu no bojo da proposta, uma ou outra norma diversa dos temas principais. Chama a atenção — e preocupa — a tentativa da coisa julgada administrativa não poder ser apreciada pelo Poder Judiciário. Considerando o despreparo de alguns órgãos, especialmente os municipais, este tema, já delicado por princípio, e, permissa vênia, de constitucionalidade duvidosa, é temeroso.
Mas o comércio eletrônico parece estar precisando de uma melhor recomendação, já que neste ano, foi um dos principais focos de problemas. Empresas de grande porte tiveram de se abster a continuar a vender por problemas de entrega. Apesar da legislação atual permitir a atuação das autoridades, não há dúvidas que uma regulamentação específica deverá ser mais útil que as ferramentas atualmente disponíveis.
Outra questão relevante em 2011 foi a fraude perpetrada contra bancos, principalmente no estado do Rio de Janeiro, por advogados que, ao que se imaginava, defendiam interesse de consumidores. Dezenas de milhões de reais foram recebidos por conta de ações pedindo diferenças dos “planos” de conversão da moeda do passado, por advogados com procurações falsas. Boa parte dos suspeitos está detida em ação do Tribunal de Justiça fluminense. Ainda está se apurando o montante total, mas o prejuízo é enorme. Provavelmente uma das maiores fraudes praticada através do Poder Judiciário.
E os órgãos administrativos resolveram, de vez, aumentar as multas por suposta infração a lei. Algumas são milionárias! A imensa maioria delas será objeto de discussão judicial, como sempre ocorre com multas de valor muito alto. Este é um tema que está clamando por uma melhor discussão legislativa, mas foi esquecido na proposta de reforma do código. É necessário melhor regulamentar a aplicação de sanções.
Também é importante ressaltar que, cada vez mais, as discussões sobre aplicabilidade de normas jurídicas têm alcançado o STJ, que recentemente decidiu sobre a competência das ações civis públicas, entre outros temas bastante relevantes. Nossa Justiça é lenta. E os temas que agora entram em discussão nas cortes superiores têm alguns anos de existência nos Juizados e Varas Cíveis e especializadas do país. A importante atitude do STJ de aceitar reclamações das ações de JEC, de resto um mandamento constitucional, está prestes a sofrer restrições (é provável que, quando da leitura deste artigo, já esteja em vigor a nova regra), permitindo reclamações apenas quando súmulas seja contrariadas, o que é um problema para os participantes da relação de consumo, já que o STJ é parcimonioso na edição das súmulas.
Mas, o mais importante é que o direito do consumidor parece ter chegado a um ponto de maturidade, onde as avaliações de seu curso saem das questões iniciais e começam a adentrar em temas mais sutis, reconhecendo-se que, em linhas gerais, sua aplicação tem sido seguida pelas empresas. A diferença de conduta nos últimos 20 anos é brutal. E é bom saber que temos hoje uma relação maior de respeito entre fornecedores e consumidores. Dúvidas e infrações sempre vão existir. Não é um fenômeno brasileiro, mas mundial. Mas a evolução é sensível. Chega em boa hora, com a escalada do Brasil ao primeiro mundo.

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